texto de Helcio Magalhães


LIA MENNA BARRETO: INSTALAÇÕES E OBJETOS 2001 - 2011

A artista desfila seu trabalho entre o encanto e o espanto

A Galeria Thomas Cohn, em São Paulo montou, durante o mês de setembro,
uma retrospectiva significativa do potente trabalho da artista Lia Menna Barreto,
reunindo obras dos últimos dez anos.

Lia tem uma forte ligação com a galeria, desde 1990, quando Thomas Cohn
lançou a artista com a exposição "Peludos",- naquela época a galeria localizava-
se no Rio de Janeiro. Até então, Menna Barreto experimentara sua arte no Rio
Grande do Sul e algumas apresentações isoladas, quando estudou em São
Francisco. Thomas Cohn explica que já em 1990 identificou a artista como uma
das mais inovadoras, mais ousadas, mais radicais e menos comprometidas com
influências de "receitas de arte contemporânea". Assim a artista ganhou mais
outras exposições na galeria, nos anos 90: em 1992, "Cavalos", em 1995
"Ordem Noturna".

A partir destas mostras, a carreira da artista deslanchou nas cenas nacional e
internacional; de Porto Alegre, os trabalhos de Lia passam a ecoar no Rio de
Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, Porto Rico, Lisboa,
Havana, Los Angeles, Wichita, San Diego, Califôrnia, Cidade do México, Berlim,
Graz, na Austria, Friburg, na Suiça. E, entre tantas andanças, Lia passou a ser
um nome bastante festejado nas Bienais do Mercosul.

O marchant não esconde sua alegria em trazer novamente Lia Menna Barreto
16 anos depois de sua descoberta, agora no endereço paulista, em uma
retrospectiva que desenha a maturidade da artista. Com o mesmo entusiasmo,
Lia Menna Barreto enfatiza a emoção deste novo encontro com Thomas Cohn:
"em 1990 ele me lançou no Rio de Janeiro e meu trabalho ganhou, pela primeira
vez, visibilidade”.

O grande destaque da exposição está no conceito orgânico com o qual Lia
recodifica simbolicamente os personagens de sua narrativa escultórica,
operando na liberdade de fabular. Ela constrói instalações a partir de bonecas,
ou bichinhos de plásticos, deslocando-os de sua materialidade original para a
órbita artística. Lia afirma: "A idéia é trabalhar com simulacros e desestruturar

Hélcio Magalhães

seu significado com ações formais, descontextualizando-os, manipulando,

reorganizando, esculpindo e agrupando."

Nesta operação, a artista provoca ao mesmo tempo o encanto e o espanto,
utiliza-se de uma delicadeza construtiva com grande acuidade estética, o que
leva à primeira impressão, a dimensão lúdica. Tal efeito encontra uma oposição
e, até mesmo um estranhamento pelas deformações, transfigurações,
perfurações, cortes, costuras, o virar pelo avesso, as novas junções e permutas
em novo rearrajo, e neste gesto, Lia refaz uma arquitetura orgânica trazendo à
tona os sentidos, as sensações, as emoções das diacronias humanas, das
rupturas, dos regimes noturnos, dos invisíveis.

Embora, eu já havia conhecido o trabalho de Lia Menna Barreto pela 4º Bienal
do Mercosul, foi em 2008, na exposição Mão Dupla, no SESC Pinheiros, em São
Paulo, que fiquei arrebatado pela poética da artista. Na ocasião, a obra "Flores
de Rato", criada a partir de centenas de ratinhos brancos de plástico trazia de
imediato a tensão entre o real e o simulacro. A artista investe em um profundo
mergulho à procura de harmonizar as diacronias com uma cuidadosa estética.

A composição léxica de sua obra é marcada por uma malha simbólica permeada
por efeitos de mandalas, flores, borboletas, brinquedos e mesmo os elementos
abjetos, como ratos, lagartichas, sapos, cabeças de bonecas cortadas são
domados, pelas mãos da artista e dotados de uma poética encantadora.

A exposição mostra um amplo espectro do fazer criativo de Lia. A galeria foi
tomada interna e externamente pela plástica de Menna Barreto, à procura de
amplo diálogo entre obras produzidas em diferentes períodos.

Logo na entrada pôde-se experimentar a textura criada sobre seda, na qual
flores, bonecas e borboletas foram fundidos ao tecido por calor, a transparência
ganha delicadeza pela luz e cria uma atmosfera mágica, lúdica, leve, própria do
mundo infantil. Foram quatro sedas apresentadas, em uma espécie de bordado
fake, compostas em seda pura com os bichinhos de plástico agregados em
processo de fusão;

A obra “Chatas” apresenta várias bonecas iguais planificadas pelo calor e unidas
por uma fita;

Na instalação Wá Wá, Lia utiliza-se do nome boneco em mandarim para
apresentar uma coleção de bonequinhos, todos eles planificados por calor e
pressão dispostos em uma vitrine horizontal fechada por vidro;

Ao fundo da galeria foi instalado o trabalho “Pele de Boneca” construído por fios
recortados de cabeças de bonecas, como cascas de laranjas, organizados como
uma cortina e, integram ainda esta instalação as cabeças do avesso que
ocuparam o chão e as paredes do espaço expográfico.

Lia Menna Barreto é original do Rio de Janeiro, mas adotou o Rio Grande do Sul
como o lugar de sua produção, quando ingressou no Ateliê Livre de Porto
Alegre, nos anos de 1970. Formou-se na Universidade Federal do Rio Grande
do Sul, em 1985. Nos anos 90 estudou nos Estados Unidos, em Stanford
University, de São Francisco e participou da 6º Bienal de Havana, e, da 1º e da
4º Bienal do Mercosul. De Porto Alegre, passou a viver em Eldorado do Sul,
onde mantém sua residência e ateliê. Atualmente a artista dedica-se a uma
revisão de sua pesquisa e trajetória, iniciada em 1978 reinvestindo na
experiência acumulada com as pesquisas criativa e se dedicando a expor seu
trabalho procurando sempre novos diálogos.

Lia Mena Barreto
Exposição: Instalações e Objetos 2001 – 2011
Galeria Thomas Cohn
Setembro 2011

Hélcio Magalhães é Doutor em artes e dedica-se `a pesquisa da fotografia e crítica de
arte.